Você já pegou o extrato de um financiamento ou empréstimo e, no meio de tantos números, encontrou uma sigla misteriosa como “SEG PREST” ou “Seguro Proteção Financeira”? Para muitos brasileiros, essa é a primeira vez que percebem que, junto com o crédito que precisavam, acabaram contratando um seguro que não pediram ou que foram levados a acreditar que era obrigatório. A sensação é, no mínimo, frustrante.
Esse sentimento de ter sido enganado ou pressionado, no entanto, não é uma sentença definitiva. O que muitos não sabem é que a legislação brasileira protege o consumidor contra práticas como essa, e conhecer seus direitos é o primeiro passo para virar o jogo.
A partir de agora, vamos detalhar o caminho exato para você entender essa cobrança, questioná-la com confiança e, se for a sua decisão, eliminá-la de vez do seu orçamento, colocando você de volta no controle do seu dinheiro.
Afinal, o que é o Seguro Prestamista e por que ele está no seu contrato?
Antes de mais nada, é preciso entender o que é este produto. O seguro prestamista é, na sua essência, um seguro de proteção de crédito. Sua função é garantir que a dívida de um empréstimo, financiamento ou até mesmo do saldo do cartão de crédito seja quitada caso algum imprevisto grave aconteça com a pessoa que contratou o crédito.
Os imprevistos cobertos, chamados de “sinistros”, geralmente incluem:
- Morte
- Invalidez permanente ou temporária
- Desemprego involuntário (para trabalhadores com carteira assinada)
- Perda de renda (para profissionais autônomos)
Ele serve como uma dupla proteção: para a instituição financeira, que garante que não terá prejuízo, e para a família do contratante, que não herdará a dívida em um momento já tão delicado. É por isso que os bancos e financeiras o oferecem com tanta insistência: para eles, é um produto lucrativo que reduz o risco da operação de crédito.
Sou obrigado a contratar? Entendendo a “Venda Casada” e seus Direitos
Esta é a pergunta de ouro, e a resposta é direta: NÃO. Na esmagadora maioria dos casos, você não é obrigado a contratar o seguro prestamista para ter acesso a um empréstimo ou financiamento.
A prática de condicionar a liberação de um produto ou serviço à contratação de outro é chamada de venda casada, e ela é considerada uma prática abusiva e ilegal pelo Código de Defesa do Consumidor (Artigo 39, Inciso I). O banco não pode negar seu empréstimo simplesmente porque você se recusou a contratar o seguro. Você tem total liberdade de escolha.
A única exceção notável a essa regra ocorre em alguns financiamentos imobiliários dentro do Sistema Financeiro de Habitação (SFH). Nesses casos, a legislação exige a contratação de seguros por Morte e Invalidez Permanente (MIP) e Danos Físicos ao Imóvel (DFI). Mesmo assim, você geralmente tem o direito de pesquisar e escolher a seguradora que oferece as melhores condições, não sendo obrigado a fechar com a seguradora indicada pelo banco.
Como cancelar o seguro prestamista? O passo a passo definitivo
Se você identificou que contratou o seguro sem querer ou se simplesmente decidiu que não precisa mais dessa cobertura, saiba que o cancelamento é um direito seu a qualquer momento. Siga este passo a passo para fazer valer sua vontade:
1.Encontre a Apólice e Leia o Contrato
O primeiro passo é agir como um detetive. Procure em seus documentos a apólice do seguro ou a cláusula específica dentro do seu contrato de empréstimo que detalha o “Seguro de Proteção Financeira”. Anote o nome da seguradora e o número da apólice.
2.Entre em Contato com a Instituição Financeira
Seu primeiro ponto de contato deve ser o banco ou a financeira que te vendeu o crédito. Utilize os canais oficiais de atendimento: fale com seu gerente, ligue para a central de atendimento ou use o chat do aplicativo.
3.Formalize o Pedido de Cancelamento
De forma clara e objetiva, informe que você deseja exercer seu direito de cancelar o seguro prestamista atrelado ao seu contrato (informe o número). É fundamental que você tenha uma prova dessa solicitação. Se for por telefone, anote o nome do atendente, a data, a hora e, o mais importante, o número de protocolo. Se possível, faça a solicitação por e-mail ou pelo chat, para que fique tudo registrado por escrito.
4.Aguarde a Confirmação e o Recálculo
A instituição tem um prazo para processar sua solicitação. Eles devem confirmar o cancelamento e, caso o seguro tenha sido pago de forma diluída nas parcelas, eles devem apresentar um novo cálculo do seu saldo devedor, agora sem o custo do seguro.
E se o banco se recusar a cancelar? Quais são os próximos passos?
Infelizmente, não é raro que as instituições criem dificuldades para o cancelamento. Se isso acontecer, não desista. Você tem um caminho claro de escalada para fazer valer seus direitos.
- 1º Nível: Ouvidoria do Banco: Se o atendimento inicial falhar, o próximo passo é registrar uma reclamação na Ouvidoria da própria instituição. A Ouvidoria é um canal de segunda instância, com mais autonomia para resolver problemas.
- 2º Nível: Plataformas de Defesa do Consumidor: Você pode registrar sua reclamação gratuitamente em plataformas como o Consumidor.gov.br (mantida pelo Governo Federal) ou no Procon do seu estado. A exposição pública costuma acelerar a resolução.
- 3º Nível: SUSEP (Superintendência de Seguros Privados): A SUSEP é o órgão do governo que fiscaliza o mercado de seguros. Uma reclamação formal no site da SUSEP tem um peso enorme, pois a seguradora parceira do banco será notificada e obrigada a responder.
- Último Recurso: Via Judicial: Caso nada disso resolva, você pode procurar o Juizado Especial Cível (conhecido como “Tribunal de Pequenas Causas”). Para causas de menor valor, você nem mesmo precisa de um advogado para dar entrada no processo.
Cancelei. Tenho direito a receber o dinheiro de volta?
Sim. Ao cancelar o seguro prestamista, você tem direito à restituição do prêmio pago referente ao período que ainda não foi utilizado. “Prêmio”, no jargão de seguros, é simplesmente o valor que você paga pelo seguro.
O cálculo da devolução é proporcional ao tempo restante do seu contrato. Por exemplo, se você pagou por um seguro que cobriria um empréstimo de 48 meses e decidiu cancelar no 12º mês, você tem direito a receber de volta o valor correspondente aos 36 meses restantes.
Pagamento do Seguro | Duração do Contrato | Cancelamento no Mês | Período a ser Restituído |
R$ 1.200,00 (Pago à vista) | 24 meses | 6º mês | 18 meses (75% do valor) |
R$ 50,00 (por mês) | 48 meses | 12º mês | 36 meses |
Geralmente, o valor a ser restituído é abatido do seu saldo devedor, diminuindo o valor das parcelas futuras ou quitando as últimas. Em alguns casos, o valor pode ser depositado diretamente na sua conta.
Antes de cancelar, vale a pena refletir: o seguro prestamista é sempre um vilão?
Apesar de a “venda casada” ser ilegal e irritante, é importante analisar a situação com a cabeça fria. O produto em si, o seguro prestamista, pode ser muito útil em alguns cenários. Antes de correr para cancelar, pergunte-se:
- Qual o valor da minha dívida? Para um financiamento imobiliário de 30 anos, ter um seguro que quita a dívida em caso de morte pode ser a maior proteção que você deixa para sua família.
- Eu sou o principal provedor da minha casa? Se seus dependentes ficariam em uma situação financeira difícil caso algo acontecesse com você, o seguro pode trazer uma paz de espírito imensa.
- Tenho uma profissão de risco ou renda variável? Para profissionais autônomos, a cobertura de perda de renda ou invalidez temporária pode ser um salva-vidas.
Por outro lado, para empréstimos de baixo valor e curto prazo, ou se você já possui um bom seguro de vida particular, o seguro prestamista pode ser, de fato, uma despesa redundante e desnecessária.
A decisão final é sua. O importante é que ela seja uma escolha consciente, e não uma imposição. Conhecer seus direitos é o primeiro passo para tomar as rédeas da sua vida financeira e garantir que cada centavo do seu dinheiro trabalhe a seu favor.
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