Depois de décadas de mistério, pesquisadores conseguiram identificar e descrever o fungo microscópico responsável pela criação do LSD. E a descoberta foi bem mais complicada do que imaginavam.
Uma Busca que Durou Décadas
Você já deve ter ouvido falar do LSD, né? Aquela substância psicodélica que marcou os anos 60 e virou símbolo de uma geração inteira. Mas o que muita gente não sabe é que sua origem sempre foi um grande enigma para os cientistas.
A história começou em 1963, quando um químico suíço chamado Albert Hofmann descobriu que certas plantas da família das glórias-da-manhã tinham propriedades alucinógenas. Essas plantinhas, que aqui no Brasil conhecemos como “campainha” ou “corriola”, eram usadas em rituais religiosos pelos povos mesoamericanos há milhares de anos.
O curioso é que Hofmann já sabia que essas plantas continham substâncias psicoativas. Mas havia um problema: essas substâncias geralmente vêm de fungos, não de plantas. Onde estava o fungo responsável?
O Mistério do Fungo Invisível
Por mais de 60 anos, os cientistas procuraram esse fungo sem sucesso. Era como tentar achar uma agulha no palheiro, só que pior – ninguém sabia direito como era a agulha.
O problema é que esse fungo é diferente dos outros da mesma família. Enquanto a maioria dos fungos similares cresce na superfície das plantas (onde dá pra ver), este aqui se esconde dentro da planta, vivendo em simbiose perfeita. É praticamente um inquilino invisível.
Corinne Hazel e Daniel Panaccione, da Universidade da Virgínia Ocidental, nos Estados Unidos, decidiram resolver esse mistério de uma vez por todas. Eles sabiam que o fungo existia porque encontravam seu DNA nas sementes e porque, quando aplicavam fungicida nas plantas, as substâncias psicoativas desapareciam.
Os pesquisadores tiveram que ser bem criativos. Primeiro, aumentaram as amostras das plantas em até 200 vezes no microscópio, procurando por qualquer sinal de vida fúngica. É como procurar um fio de cabelo numa foto ampliada – precisa de muita paciência e olho clínico.
Depois, eles pintaram alguns tecidos das plantas com corantes especiais para destacar possíveis fungos. Outros pedaços receberam nutrientes extras para estimular o crescimento fúngico. Foi aí que Hazel teve seu momento “eureka”.
Ela estava analisando as cascas das sementes quando viu uns pelinhos brancos estranhos crescendo lá dentro. Parecia aquele funginho branco que aparece no pão velho, sabe? Só que este estava escondidinho dentro da semente.
Periglandula Clandestina: O Nome Perfeito
Quando fizeram o sequenciamento genético, confirmaram: era uma espécie completamente nova! Hazel deu o nome de Periglandula clandestina para o bichinho. O “clandestina” é perfeito, porque o fungo literalmente se esconde dentro da planta, ao contrário dos seus “primos” que vivem do lado de fora.
Mas a descoberta foi ainda mais impressionante. Os pesquisadores encontraram as substâncias psicoativas espalhadas por toda a planta – até nas raízes, onde nem tinha DNA do fungo. Isso sugere que o P. clandestina produz essas substâncias e a planta as distribui pelo corpo todo.
Muito Além do LSD
Agora vem a parte mais interessante: essa descoberta pode revolucionar a medicina. O fungo produz quantidades excepcionais de alcaloides do ergot – as mesmas substâncias que deram origem ao LSD, mas que também são usadas para tratar enxaquecas e doenças neurodegenerativas.
“Como o P. clandestina produz quantidades excepcionalmente altas desses compostos, os genes responsáveis por essa produção podem ser uma ferramenta valiosa”, explicaram os pesquisadores. Em outras palavras, agora que sabemos como o fungo faz isso, podemos tentar replicar o processo para criar medicamentos mais eficazes.
Uma Descoberta Quase Acidental
É engraçado pensar que essa descoberta gigantesca começou com uma suspeita sobre uns pelinhos brancos numa semente. Lembra um pouco da própria criação do LSD, que foi meio que um acidente de laboratório.
O próprio Hofmann, que descobriu o LSD acidentalmente em 1943 (20 anos antes de estudar as glórias-da-manhã), disse uma vez: “Eu não escolhi o LSD. O LSD me encontrou e me chamou.”
O Futuro da Pesquisa
Essa descoberta abre portas para muitas possibilidades. Primeiro, entender melhor como funciona essa parceria entre planta e fungo pode nos ajudar a desenvolver novos medicamentos para Alzheimer, Parkinson e outras doenças neurodegenerativas.
Segundo, pode revolucionar o tratamento de enxaquecas. Quem sofre com esse problema sabe como é difícil encontrar medicamentos realmente eficazes. Com essa nova fonte de alcaloides do ergot, talvez tenhamos opções mais potentes no futuro.
E terceiro, nos ajuda a entender melhor como a natureza desenvolve essas substâncias complexas. É fascinante pensar que um fungo microscópico consegue produzir compostos tão poderosos que influenciaram toda uma geração.
Conclusão
Depois de mais de 60 anos de busca, finalmente conhecemos o verdadeiro responsável pelo LSD: um pequeno fungo que vivia escondido dentro das sementes de glória-da-manhã. A Periglandula clandestina pode ser microscópica, mas seu impacto na ciência e na medicina promete ser gigantesco.
Às vezes as maiores descobertas começam com as menores pistas. Neste caso, bastaram alguns pelinhos brancos numa semente para desvendar um dos maiores mistérios da química psicodélica.
Fonte: Popular Mechanics